segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Por um novo humanismo

Por um novo humanismo :: 19/10/1970

Hoje na sociedade consumista se pensa em economizar uma única coisa: o tempo.
Se virmos a publicidade ao nosso redor, se ouvirmos o rádio, se assistirmos a televisão, as palavras frequentes são aquelas que dizem: "pronto", "vai", "rápido", "agora", "em dois minutos...".

Também a cultura e a pintura usam poucos toques, meios pobres, mas sobretudo fazem tudo depressa num campo como o da arte que, nos séculos passados, exigia tempo, muito tempo...

No ano passado, por exemplo, passamos por uma clareira, por um terreno baldio na periferia da cidade. Voltamos ali este ano e admiramos todo um conjunto de casas, de grandes casas.
Desaparecem em poucos meses, sem percebermos, ruas usadas por décadas e vemos no lugar delas rodovias magníficas...
Tudo se faz com aceleração e muita coisa é pré-fabricada.
Não falemos das comunicações, que aproximam de nós as pessoas, inclusive muito distantes, economizando assim dias de viagem.
Também os espíritos mais abertos a coisas mais sublimes, inclusive os cristãos mais atentos e atraídos pelos mistérios incompreensíveis não podem deixar de sentir a influência deste novo ritmo em que a humanidade caminha, sobretudo nas áreas mais desenvolvidas.
A maioria das pessoas acha anacrônicas as horas transcorridas em solitárias contemplações, em prolongadas meditações.
Prefere-se encontrar fórmulas breves, mas seguras, para atingir o objetivo que, neste caso, é nada mais nada menos que... a união com Deus.
É neste clima, neste contexto que considero de grande atualidade uma frase, comprovada pela experiência e atribuída a São Boaventura. Ela afirma que progride mais no caminho de Deus uma alma que em quarenta dias nunca para, do que outra que em quarenta anos, ainda que fechada num convento e com todas as ajudas para ser perfeita, de vez em quando para "nos vales das imperfeições e dos pecados veniais".
Tal afirmação não pode não causar impressão, não pode deixar de suscitar em todos uma certa carga de entusiasmo.
Mas provoca em nós pergunta: como fazer para não nos determos nas imperfeições e nos pecados veniais?

A resposta parece evidente: procurando constantemente a perfeição.
Mas em que consiste a perfeição?
Cristo nos disse: no amor, porque quem ama, não peca; no amor por Deus, que encontra o meio de se tornar concreto, vivendo o amor ao próximo.
É vivendo a caridade para com os nossos irmãos que se passa continuamente da morte à vida, que se permanece na vida, garantia da vida que não terá fim.
Hoje, quando o mundo todo está se encaminhando para um humanismo de novo cunho, que exprime as mais variadas nuances nas diversas ideologias e fascina massas e indivíduos, o imperativo cristão da caridade surge com extrema atualidade: um humanismo onde o homem olha para o homem, e o povo para o outro povo através da lente transfiguradora da pessoa de Cristo.
O Concílio mesmo tomou consciência do novo lugar que está assumindo o homem no conceito da sociedade moderna e reafirma que "a lei fundamental da humana perfeição e, portanto, também da transformação do mundo, é o novo mandamento da caridade. Aqueles que acreditam na caridade divina, fundamentam em Cristo a sua certeza de que a estrada da caridade está aberta para todos os homens e que os esforços feitos para realizar a caridade universal não são vãos".

O Papa Paulo, comentando este trecho disse: "A Igreja tende a valorizar o homem, a respeitá-lo, a dar-lhe consciência da sua grandeza; não o humilha, mas o exalta; não o narcotiza, mas o desperta para o sentido da sua dignidade; não o despreza jamais - e como poderia? -, mas o estima e o ama, debruça-se sobre ele, o abraça e quase transfunde nele o próprio coração, tal como Jesus, que lavou os pés dos apóstolos, como os santos que souberam abraçar os leprosos e os enfermos. A caridade se situa luminosamente no papel que a Igreja é chamada a desempenhar, conduzindo o homem ao seu completo desenvolvimento..."
Os santos sempre focalizaram este assunto corretamente.
De fato, chegaram ao vértice da perfeição porque amaram o próximo.
Foi escrito sobre a virgem de Sena: "...mas Catarina pensava que não é suficiente dar o que nos é pedido e não basta desviar os ouvidos daqueles que nos suplicam: ela começou a procurar os pobres. Enquanto todos dormiam, ia depor diante da porta deles pão, um frasco de vinho, um saquinho de farinha ou uma cesta de ovos, como fazia São Nicolau de Bari. E depois saia correndo para que ninguém percebesse...".
A própria Teresa d'Ávila, contemplativa por excelência, afirmava: "... Deus quer obras. Por exemplo, quer que não nos preocupemos em perder uma devoção para consolar uma doente que podemos ajudar, assumindo o seu sofrimento, jejuando, se for necessário, para lhe dar de comer... Eis aqui no que consiste a verdadeira união com o querer de Deus!"

E homens próximos ao cristianismo não podiam ter uma visão diferente. É muito belo o que Gandhi afirma no seu livro: "Antigas como as montanhas": "...se amarmos aqueles que nos amam, esta não é a não-violência. A não-violência é amar aqueles que nos odeiam. Sei quanto é difícil seguir esta sublime lei do amor. Mas as coisas grandes e boas não são todas difíceis? O amor pelo inimigo é a mais difícil de todas. Mas com a graça de Deus também esta coisa tão difícil se torna fácil de se realizar, se assim quisermos...".
"...A regra de ouro é ser amigos do mundo e considerar una toda a família humana. Quem distingue entre os fiéis da própria religião e aqueles de outra, deseduca os membros da própria e abre o caminho para a rejeição e para a irreligião".

Se hoje o pensamento de quem não crê em Deus, também influencia muito os povos jovens e muitas vezes inexperientes, é porque apresenta um certo tipo de amor pelos homens.
Certamente, vale para eles a frase da "Populorum progressio", humanismo, sim, "mas aberto para o absoluto". Senão o Apóstolo adverte: "para nada adianta".
Muito oportunamente Paulo VI esclarece: o preceito da caridade cristã contém desenvolvimentos potenciais que nenhuma filantropia, que nenhuma sociologia poderá jamais igualar. E, examinando a nossa caridade, continua: "a caridade ainda está contraída e fechada dentro dos confins de costumes, de interesses, de egoísmos que deverão, como nós pensamos, ser dilatados".
É lógico, então, tirar uma conclusão: é urgente transformar todos os nossos relacionamentos com os irmãos, pais, parentes, colegas, conhecidos, homens do mundo inteiro em relacionamentos cristãos. Impelidos e iluminados pelo amor, dar origem a obras individuais e sociais, recordando que, se um copo d'água terá a sua recompensa, um hospital, uma escola, um orfanato, um instituto de reeducação e assim por diante, que são meios para exprimir a nossa caridade, nos prepararão para enfrentar brilhantemente o exame final da vida.
De fato, Deus nos dirá:
"Tive fome no seu marido, nos seus filhos, bem como nas populações da Índia e você, vendo-me neles, me deu de comer.
"Tive sede, estava nu nos seus filhinhos toda manhã, mas também nos seus irmãos em muitas nações em que as condições de vida são desumanas, e você, vendo-me em todos, me cobriu com tudo o que possuía.
"Eu era órfão, faminto, doente na criança do seu bairro, mas também nas populações do Paquistão, devastadas por cataclismos e ameaças do colera, e você fez todo o esforço para me socorrer.
"Você suportou a sua sogra ou esposa nervosa, mas também os seus operários revoltados ou o seu patrão ainda pouco compreensivo, pois você está convencido de que não existirá uma perfeita justiça social, se não florescer de uma caridade social; e você fez isso porque me viu em todos.
"Você visitou o parente preso, rezou e socorreu aqueles que vivem oprimidos e violentados no íntimo do espírito..."
Então nós, atônitos, deixaremos sair dos nossos lábios uma só palavra: obrigada. Obrigada, meu Deus, por nos ter aberto na Terra um caminho, o caminho direto, o mais breve para chegar o mais rápido possível à destinação celeste.

Centro Chiara Lubich

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